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27 de abril de 2014

Perdoem-me se eu errar.

Joguem-me os pratos e os talheres. Atirem-me seus paus e suas pedras. Do seio da terra vieram todos vocês e para lá voltarão. Eu apenas surgi do nada e nada sempre fui e serei. Vocês são minério, são barro e donos do chão; prometidos aos céus. Ou o céu lhes é prometido, tanto faz. Eu somente sou o resto do que não serviu para nada e respiro para azucrinar o mundo com meu estômago vazio e as mãos estendidas para lhes tomar a paz.

Persigam meus anseios e os perigos que com eles estão. Não me deem piedade se não for por algum tostão. Vocês que são os proprietários e eu um simples ser pagão. 

Atirem-me a água benta e convertam minha alma. Agora que ela existe, talvez limpe os pós do portão, águe as flores do Éden e costure as túnicas dos arcanjos. Vocês são filhos e eu sou enteado. Todos vocês nasceram do homem que fez feriado. Eu apenas sou o escuro dos tempos, moldado nas matas pelos bichos fedorentos. 

Felizmente não me devem nada. Eu é quem pago todos os dias a conta da vida. Serviço que me prestam sem contratação. Está certo que é um serviço muito mal prestado e, desconfio, insignificante. Mas se está aí, uso. 

Prendam-me, peço. Não deixem que um dia me invertam as ideias. Não deixem que me recuse a aceitá-las como bem lhes servir. Matem-me antes. Ou melhor, retirem esse favor, grande favor que me prestam: de me tratar ---- ainda que seja um maltratar -- como gente.


Linhas para não escrever.

Escrevi um poema porque não havia nenhuma ideia para um texto, somente a vontade de escrever. Como um poema, em tese, parece mais simples apesar de necessitar de mais estética, surgiu a mim mais facilmente. Obviamente a estética é porca e não está nem perto de ser relevante. Mas claramente ficou melhor do que um texto viria a ser.


Eu gosto de apagar as luzes
E sufocar as vozes.

De oprimir o tempo.

Eu destrono as vontades
E desprezo quaisquer quereres.

Interfiro no pouco.

Basta respirar
E basta de aspirar.

Resigno-me ao nada.